Economia

A Intrigante Relação entre Política e Empréstimos Governamentais: O que o Brasil nos Ensina?

6min de leitura

Leandro Siqueira

Leandro Siqueira

Estrategista de Investimentos, Co-fundador da Varos

A Intrigante Relação entre Política e Empréstimos Governamentais: O que o Brasil nos Ensina?

Você já se perguntou qual é o verdadeiro poder do governo em influenciar a política por meio de bancos estatais? Se sim, o artigo "The Real Effects of Government-Owned Banks: Evidence from an Emerging Market" pode ter uma resposta para você. Este artigo mergulha fundo para entender como os empréstimos subsidiados concedidos por bancos públicos afetam as demissões/contratações das empresas que os recebem.

Para fazer isso, o autor examinou uma ampla amostra de mais de 13 mil empresas brasileiras entre 1995 e 2005. Durante esse período, cerca de 30% de todo o investimento industrial no Brasil veio de projetos financiados pelo BNDES, tornando esses empréstimos uma fonte crucial de subsídios para empresas industriais.

Sobre o Estudo

O estudo descobriu que os empréstimos estão concentrados em setores específicos, chamados de "setores prioritários". As empresas nesses setores têm acesso a mais financiamento e a taxas preferenciais.

Dados do estudo

Só para se ter uma noção, o volume médio do crédito bancário governamental destinado a empresas em setores prioritários (ponderado pelo capital da empresa) é quatro vezes maior do que o mesmo montante para empresas em setores não prioritários (3,58% x 0,90%).

Dados do estudo

Além disso, o autor também investigou se as empresas que recebem esses empréstimos tendem a criar empregos em estados onde os governantes estão tentando a reeleição. Afinal, mais empregos podem fortalecer a imagem dos políticos em busca da reeleição.

A pergunta agora é: há algum ganho político por parte do governo ao conceder empréstimos bancários para determinadas empresas?

Estimando os resultados

O autor inicia estimando a seguinte equação:

Dados do estudo

Y é o crescimento do emprego da empresa i, no setor j, no estado s e no tempo t.

Allied é um indicador igual a 1 se o incumbente no estado s e tempo t for aliado do governo central.

Reelection é um indicador igual a 1 se houver disputa pela reeleição local dentro de dois anos.

E Priority indica se uma empresa pertence a um setor j prioritário.

O termo θtj representa os efeitos fixos do setor no ano, ou seja, o crescimento do emprego independentemente dos incumbentes aliados, se existe uma eleição próxima ou se o setor é considerado prioritário.

Vamos agora à estimação.

Primeiro o autor estima a equação usando a amostra de empresas com pelo menos 500 empregados.

Os resultados são mostrados na coluna (1).

Dados do estudo

Agora, olha que curioso: o crescimento do emprego em empresas de setores não prioritários não é elevado nos estados com políticos aliados.

Ele também não é elevado para as empresas dos setores prioritários nos períodos distantes das eleições.

O crescimento do emprego em estados com incumbentes aliados torna-se mais elevado apenas nas empresas prioritárias e em período próximo das corridas eleitorais (Allied x Reelection x Priority).

No entanto, apesar da importância econômica, o resultado não é significativo.

O autor decide então estimar a seguinte equação.

Dados do estudo

Reelection(0) é um indicador igual a um no ano de uma disputa de reeleição. Reelection(–1) é um indicador igual a um no ano anterior à disputa pela reeleição.

Todas as outras variáveis são definidas como antes. A ideia é que a partir dessa equação, a análise de crescimento do emprego possa ser decomposta no tempo.

  • Reelection(0) para uma análise no ano anterior às corridas eleitorais e
  • Reelection(-1) para a análise entre um e dois anos antes das eleições.

Os resultados são apresentados na coluna (2).

Dados do estudo

Como anteriormente, o crescimento do emprego não é elevado nos estados com incumbentes aliados para as empresas não prioritárias e nem é elevado para as empresas prioritárias nos anos mais distantes das corridas eleitorais.

Só que a grande descoberta vem aqui: a decomposição mostrou que as empresas de setores prioritários em estados com incumbentes aliados expandem o emprego 1-2 anos antes das corridas eleitorais!

Há um acréscimo significativo no crescimento do emprego nas empresas prioritárias. Mas e os resultados anteriores?

Ao analisarem o crescimento do emprego durante estes 2 anos eles não perceberam este padrão.

Segundo o autor, isso é consistente com literaturas anteriores que sugerem que os ciclos políticos oportunistas duram pouco nos mercados emergentes.

Dados do estudo

Para testar a possibilidade de empresas que se situam em estados com incumbentes aliados terem taxas médias de crescimento no emprego mais elevadas, o autor faz um controle por efeitos fixos.

Os resultados estão contidos nas colunas (3) — que estima a equação (1) com o efeito fixo — e (4) — que estima a equação (2) com o efeito fixo.

Dados do estudo

Os valores encontrados confirmam as conclusões anteriores, sendo econômica e estatisticamente mais fortes.

Para refinar ainda mais os resultados encontrados, o autor restringe a análise a uma amostra de incumbentes aliados eleitos após uma eleição concorrida. Afinal, se os políticos estão usando empréstimos bancários governamentais para ajudar os incumbentes na busca pela reeleição, os efeitos anteriores deverão aparecer mais fortes ainda nessa amostra.

As colunas (5) a (8) reproduzem todas as estimações anteriores usando essa nova amostra.

Dados do estudo

Os resultados confirmam as conclusões anteriores, que também se tornam econômica e estatisticamente mais fortes. As empresas dos setores prioritários expandem o emprego entre 1-2 anos antes das corridas eleitorais dos incumbentes aliados.

Para verificar os resultados, o autor também estima as equações com base na amostra de incumbentes eleitos após eleições pouco concorridas

As colunas (10) e (11) relatam os valores encontrados.

Dados do estudo

Os resultados mostram efeitos economicamente menores e estatisticamente insignificantes.

O mesmo ocorreu com uma amostra de empresas menores, que possuem de 200 a 500 empregados.

Os resultados dessa estimação estão contidos na coluna (9) e vão de acordo com o esperado.

Dados do estudo

Conclusão do Estudo

Os resultados são fascinantes: as empresas nos setores prioritários em estados com governantes aliados expandem o emprego entre 1 e 2 anos antes das eleições. No entanto, o crescimento do emprego nas empresas não prioritárias não é tão forte nos estados com governantes aliados.

Isso sugere que os políticos brasileiros usam os empréstimos bancários governamentais como uma forma de influenciar as empresas e transferir empregos para regiões politicamente atraentes.

Recentemente, vimos o governo anunciar o Nova Indústria Brasil, que promete R$ 300 bilhões em financiamentos para fomentar a indústria nacional, sendo R$ 250 bilhões sob responsabilidade do BNDES.

Resta saber se esse programa seguirá a mesma abordagem dos empréstimos bancários governamentais do passado ou se teremos uma nova estratégia do governo.

Em resumo, este estudo nos mostra como os empréstimos bancários governamentais podem ser usados como ferramentas políticas, influenciando onde os empregos são criados e transferidos. Será interessante ver como essa dinâmica evolui no futuro.

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